Moravam no mesmo bairro. Uma era boa e caridosa; outra, má e ingrata.
A boa, como fosse diligente, tinha a casa bem arranjadinha; a má, como fosse vagabunda, vivia ao léu, sem eira nem beira.
Certa vez... a má, em véspera de dar cria, foi pedir agasalho à boa:
- Fico aqui num cantinho até que meus filhotes possam sair comigo. É por eles que peço...
A boa cedeu-lhe a casa inteira, generosamente.
- Podes entregar-me a casa agora?
A má pôs-se a choramingar.
- Ainda não, generosa amiga. Como posso viver na rua com filhinhos tão novos? Conceda-me um novo prazo.
A boa concedeu mais quinze dias, ao termo dos quais voltou.
- Vai sair agora?
- Paciência, minha velha, preciso de mais um mês.
A boa concedeu mais quinze dias; e ao terminar o último prazo voltou.
Mas desta vez a intrusa, rodeada dos filhos já crescidos, robustos e de dentes arreganhados, recebeu-a com insolência:
- Quer a casa? Pois venha tomá-la, se é capaz...
José Bento Monteiro Lobato
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