O burro juiz

Disputava a gralha com o sabiá, afirmando que a sua voz valia a dele. Como as outras aves rissem daquela pretensão, a bulhenta matraca de penas, furiosa, disse:
- Nada de brincadeiras. Isto é uma questão muito séria, que deve ser decidida por um juiz. Canta o sabiá, canto eu, e a sentença do julgador decidirá quem é o melhor artista. Topam?
- Topamos! - piaram as aves - mas quem servirá de juiz?
Estavam a debater este ponto, quando zurrou um burro.
- Nem de encomenda! - exclamou a gralha - está lá um juiz de primeiríssima para julgamento de música, pois nenhum animal possui maiores orelhas. Convidê-mo-lo.
Aceitou o burro o juizado e veio postar-se no centro da roda.
- Vamos lá, comecem! - ordenou ele.
O sabiá deu um pulinho, abriu o bico e cantou. Cantou como só cantam sabiás, garganteando os trinos mais melodiosos e límpidos. Uma pura maravilha, que deixou mergulhado em êxtase o auditório em peso.
- Agora eu! - disse a gralha, dando um passo à frente. E abrindo a bicanca matraqueou uma grita de romper os ouvidos aos próprios surdos.
Terminada a justa, o meritíssimo juiz deu a sentença:
- Dou ganho de causa à excelentíssima senhora dona Gralha, porque canta muito mais forte que mestre sabiá.

José Bento Monteiro Lobato

Moral da Estória:
Quem burro nasce, togado ou não, burro morre.

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