Sebastigrão

Sebastigrão, Tigrão para os íntimos, trabalhava num circo. Varria o chão, como sempre fazia após cada espetáculo, olhando com admiração os bichos que se preparavam para a próxima apresentação, quando chegou até ele o pombo Pedro com uma mensagem.
- Obrigado, Pedro.
- Às ordens, Tigrão.
Sebastigrão abriu a mensagem, curioso, e encontrou o seguinte escrito no papel:
"Caro amigo Tigrão, resolvi fazer uma visita ao seu circo já que há muito tempo não nos vemos. Quero matar as saudades. Chego na sexta-feira, dia 14. Abraços do Hipotito."
Tigrão ficou branco da cor do papel, depois vermelho como um pimentão. Que surpresa era aquela! Ah, não! Agora ele estava mesmo numa fria!
É que Sebastigrão conhecia o hipopótamo Hipotito desde a infância. Com o passar dos anos, os dois acabaram morando em lugares diferentes, mas sempre conversavam por meio de cartas.
O fato é que Hipotito tinha ficado rico, muito rico. Tigrão, por sua vez, nunca contara que trabalhava no circo varrendo o chão e fazendo outros serviços de limpeza.
Na verdade, tinha feito o amigo acreditar, pelas cartas, que ele próprio era o dono do circo.
E agora, aquela! Dia 14, sexta-feira, seria... no dia seguinte!
O pobre tigre tinha que correr, e muito, se quisesse manter aquela farsa.
Assim, ao sair do circo, Sebastigrão passou numa loja finíssima e comprou roupas novas: um paletó, gravata e até uma cartola. Passou na barbearia e fez a barba. Ao olhar-se no espelho, ficou satisfeito - parecia outra pessoa!
Logo na manhã seguinte aconteceu o reencontro dos dois amigos. Hipotito deu um abraço bem forte em Tigrão.
- Amigo, eu estou até emocionado! Há quanto tempo! Mas como você está bem e bonito! - disse Hipo.
- Que bom que você veio, Hipotito. Deixe-me mostrar meu circo a você. Vamos dar uma voltinha...
E cheio de orgulho, Sebastigrão ia apresentando toda a bicharada: o macaco mágico Macágico; o Juba Quente, leão que saltava por aros de fogo; a fofa elefoa Flô; o Pandaço, urso panda que era palhaço, enfim... todos os que trabalhavam lá.
Hipotito ia conhecendo os artistas e ficando encantado.
- E então, Hipo, que achou do meu circo? - perguntou Tigrão, já quase acreditando que aquele lugar era mesmo seu.
- Achei demais,Tigrão! E agora estou ainda mais convencido de que o que vim fazer aqui é o correto.
- Como assim? - perguntou o tigre, desconfiado.
- É uma longa história....
Sentaram-se nuns tambores e Hipotito começou a falar. - ... e foi assim que, apostando todo o meu dinheiro num negócio de risco, perdi tudo e fiquei pobre, muito pobre, paupérrimo.
Sebastigrão estava petrificado com a notícia. Logo o Hipotito, para quem ele tinha inventado aquela história só para mostrar que era rico também...
- Eu estou contando com você, Tigrão!
- Co... comigo?
- É... vim aqui porque, miserável como estou, preciso de um emprego. E você, como dono de circo, sabe como é... Será que não poderia dar um jeitinho e me arranjar um trabalho, qualquer coisa, como varredor de chão, por exemplo?
Agora é que Tigrão não conseguia nem piscar, nem abrir a boca, nem sequer fazer um ruído. Como é que ele, Sebastigrão, varredor de chão, iria poder dar um emprego a Hipotito?
Em que confusão ele se metera!
- Amigo, não fique assim - disse Hipo, vendo a reação do amigo - se você não puder me ajudar, entenderei...
- Não, é que...
E foi aí que Sebastigrão decidiu que só havia uma maneira justa de terminar com tudo aquilo. Assim, foi dizendo:
- Sabe o que é, Hipotito? Eu também tenho uma longa história para contar a você. Ela é antiga, desde que nós começamos a escrever um para o outro...
E Sebastigrão contou tudo. Falou das mentiras, do seu verdadeiro trabalho no circo, da vida simples e humilde e de como tinha achado que o melhor era FINGIR ser rico para agradar o amigo.
Ao terminar, tomou uma decisão:
- Hipo, tenho uma idéia. Eu vou pedir ao dono verdadeiro do circo um emprego para você.
- Obrigado, Tigrão! Nem sei como agradecer...
E o dono, o Chimpan Zé, concordou em empregar o Hipotito que daquele dia em diante iria ajudar o amigo Tigrão na limpeza do circo.
Sebastigrão, depois disso... nunca mais quis ser outra pessoa. O bom mesmo, ele achava agora, era ser ele próprio! 

Lelê Samiranda

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